O SUPERINTENDENTE DE TRIBUTAÇÃO, no uso da
atribuição conferida pelo inciso II, do art. 82 da Resolução SEFAZ nº
89, de 30 de junho de 2017,
CONSIDERANDO:
- a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) no Recurso
Extraordinário nº 330.817, transitada em julgado em 13 de março de
2018, em que foi fixada a tese: "A imunidade tributária constante
do art. 150, VI, d, da CF/88 aplica-se
ao livro eletrônico (e-book), inclusive aos suportes
exclusivamente utilizados para fixa-lo", e
- o disposto no Processo nº E-04/006/150/2018,
R E S O L V E:
APROVAR O PARECER A SEGUIR:
Senhor Superintendente,
A discussão acerca da extensão da imunidade prevista no art.
150, inciso VI, alínea 'd', da Constituição da
República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB/1988) aos livros
digitais não é recente. A referida norma dispõe:
Art. 150. Sem prejuízo de outras
garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos
Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
(...)
VI - instituir impostos sobre:
(...)
d) livros, jornais, periódicos e o
papel destinado a sua impressão.
Entretanto, em 13 de março de 2018, transitou em julgado decisão
do STF, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 330.817, cuja
matéria teve sua repercussão geral reconhecida pelo Tribunal:
"Decisão: O Tribunal, por unanimidade e nos termos do voto do
Relator, apreciando o tema 593 da repercussão geral, negou
provimento ao recurso extraordinário e fixou a seguinte tese: 'A
imunidade tributária constante do art. 150, VI, d, da CF/88 aplica-se
ao livro eletrônico (e-book), inclusive aos suportes
exclusivamente utilizados para fixá-lo'." (1)
De acordo com o voto do Relator, Ministro Dias Toffoli, o
referido dispositivo visa “imunizar o bem utilizado como veículo do
pensamento, da informação, da cultura e do conhecimento”. Nesse
sentido, o papel torna-se apenas a forma por meio da qual o
conteúdo é disseminado, motivo pelo qual, segundo o Relator, a
imunidade alcança não apenas o livro digital (e-book), mas
também o audiolivro, e o aparelho específico para leitura de livros
digitais (e-reader). Entretanto, a imunidade não alcança
os aparelhos multifuncionais, como tablets,
smartphones e laptops, visto que estes não são
usados apenas para a leitura de livros digitais.
O Ministro assinala ainda que deve ser feita uma interpretação
evolutiva da norma, de modo que, em função da realidade na qual
está inserida, a norma pode adquirir novos significados, mesmo que
mantenha inalterada sua estrutura formal. Assim, evita-se o
esvaziamento da norma apenas em função da passagem do tempo.
De acordo com o voto do Relator, Ministro Dias Toffoli:
"(...) o constituinte não objetivou conferir um benefício a
editoras ou a empresas jornalísticas, mas sim imunizar o bem
utilizado como veículo do pensamento, da informação, da cultura e
do conhecimento (...)
Dessa perspectiva, não me parece que o art. 150, VI, d, da Constituição,
refira-se apenas ao método gutenberguiano de produção de livros.
Nem penso que o vocábulo “papel” seja essencial ao conceito desse
bem final. Com efeito, o suporte das publicações é apenas o
continente (corpus mechanicum) que abrange o conteúdo (corpus
misticum) das obras, não sendo ele o essencial ou o condicionante
para o gozo da imunidade. (...)
Também me parece dispensável para o enquadramento do livro na
imunidade em questão que seu destinatário (consumidor) tenha
necessariamente que passar sua visão pelo texto e decifrar os
signos da escrita. Quero dizer que a imunidade alcança o denominado
“audio book”, ou audiolivro (livros gravados em áudio, seja no
suporte CDRom, seja em qualquer outro). Historicamente, o processo
de leitura associava-se à declamação e à escuta, e isso perdurou
por muito tempo. (...) Note-se que essa conclusão é harmônica com a
teleologia da norma e está intimamente ligada à liberdade de ser
informado, à democratização e à difusão da cultura, bem como à
livre formação da opinião pública.
(...)
O avanço na cultura escrita tem apontado, outrossim, para o
advento de novas tecnologias relativas ao suporte dos livros, como
o papel eletrônico (e-paper) e o aparelho eletrônico (como o
e-reader) especializados na leitura de obras digitais, com
os quais se intenta, justamente, imitar a leitura em papel físico.
Em meu entendimento, elas estão igualmente abrangidas pela
imunidade em tela (...). Como se vê, o argumento de que a vontade
do legislador histórico foi restringir a imunidade ao livro editado
em papel não se sustenta em face da própria interpretação histórica
e teleológica do instituto e, mesmo que se parta da premissa de que
o legislador constituinte de 1988 teria querido restringir a
imunidade, é de se invocar, ainda, a interpretação evolutiva,
método interpretativo específico das normas constitucionais
apontado em obra doutrinária pelo Ilustre Ministro Roberto Barroso
(Interpretação e aplicação da Constituição. Saraiva, 137): "O que é
mais relevante não é a occasio legis, a conjuntura em que editada a
norma, mas a ratio legis, o fundamento racional que a acompanha ao
longo de toda a sua vigência. Este é o fundamento da chamada
interpretação evolutiva. As normas, ensina Miguel Reale, valem em
razão da realidade de que participam, adquirindo novos sentidos ou
significados, mesmo quando mantidas inalteradas as suas estruturas
formais”.
(...) Assim, a interpretação das imunidades tributárias deve se
projetar no futuro e levar em conta os novos fenômenos sociais,
culturais e tecnológicos. Com isso, evita-se o esvaziamento das
normas imunizantes por mero lapso temporal, além de se propiciar a
constante atualização do alcance de seus preceitos.
CONCLUSÃO: Sintetizando e já concluindo, considero que a
imunidade de que trata o art. 150, VI, d, da Constituição
alcança o livro digital (e-book). De igual modo, as
mudanças históricas e os fatores políticos e sociais presentes na
atualidade, seja em razão do avanço tecnológico, seja em
decorrência da preocupação ambiental, justificam a equiparação do “
papel”, numa visão panorâmica da realidade e da norma, aos suportes
utilizados para a publicação dos livros. Nesse contexto moderno,
contemporâneo, portanto, a teleologia da regra de imunidade
igualmente alcança os aparelhos leitores de livros eletrônicos (ou
e-readers) confeccionados exclusivamente para esse fim,
ainda que, eventualmente, estejam equipados com funcionalidades
acessórias ou rudimentares que auxiliem a leitura digital, tais
como dicionário de sinônimos, marcadores, escolha do tipo e do
tamanho da fonte etc. Embora esses aparelhos não se confundam com
os livros digitais propriamente ditos (e-books), eles
funcionam como o papel dos livros tradicionais impressos e o
propósito é justamente mimetizá-lo. Enquadram-se, portanto, no
conceito de suporte abrangido pela norma imunizante. Esse
entendimento, como se nota, não é aplicável aos aparelhos
multifuncionais, como tablets, smartphone e
laptops, os quais vão muito além de meros equipamentos
utilizados para a leitura de livros digitais."
Ante o exposto, conclui-se que, para os efeitos da legislação
tributária fluminense, em consonância com decisão do STF, a
imunidade tributária constante do art. 150, inciso VI, alínea 'd',
da CRFB/1988,
aplica-se ao livro eletrônico (e-book), inclusive aos
suportes exclusivamente utilizados para fixá-lo.
Coordenadoria de Estudos e Legislação Tributária, em 25 de
janeiro de 2018.
FERNANDA MONTEIRO DE
UZÊDA
Auditora Fiscal da Receita Estadual
______________________________________________________
(1) BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº
330.817-RJ. Pleno. Relator: Ministro Dias Toffoli. Brasília, 8 de
março de 2017. Disponível em: <http://www.stf.jus.br>.
Aprovo. Dê-se caráter normativo.
Publique-se.
SUT, 29 de janeiro de 2019
ALBERTO DA SILVA
LOPES
Superintendente de Tributação
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